A beleza da História da Salvação está em sua mensagem salvífica sobre a verdade da Boa Nova de Cristo, um ato na história que se reflete na eternidade. Para se contar essa história, o autor primário (Deus), utiliza todas as potencialidades do autor secundário (os autores bíblicos, como os quatro evangelistas) e forma um mosaico de estilos e gêneros literários. Independente da forma ou estilo, todos contam algo fundamental para se entender a mensagem divina.
Dentro dos estilos e gêneros literários estão recursos estilísticos, retóricos tradicionais de uma cultura ou assimilados para ser usados com o mesmo propósito. Dentre esses recursos está o “inclusio”. No estudo bíblico, um ‘inclusio’ é uma maneira de destacar o que está entre a primeira e a última citação, como se fossem “parênteses” simbólicos que, quando percebidos, chamam a atenção para algo intencionalmente destacado.
Existem diversos ‘inclusios’ na Bíblia. O Evangelho segundo São Marcos é famoso por utilizar esse recurso de maneira mais explícita. O maior ‘inclusio’ do NT, no entanto, está no Evangelho segundo São Mateus. Voltaremos a ele mais adiante. No momento, destaco outro possível ‘inclusio’ bastante simbólico. Aliás, como eu deixo claro na reflexão sobre a Liturgia de hoje (Solenidade de São José, esposo da Virgem Maria), a própria Liturgia faz esse ‘inclusio’.
Em ‘Mt 1,16’, o evangelista nos ensina que o pai de São José se chamava Jacó. Isso não é mera coincidência. É um sinal que Deus, o artista divino, pinta através da criação. Ainda no livro do Gênesis, Jacó foi o patriarca que passou a se chamar Israel (Gn 35,10). Consequentemente, seus doze filhos seriam os patriarcas das “12 tribos de Israel”.
Um desses filhos ficaria conhecido como José do Egito. José, filho de Jacó, recebia de Deus o dom dos sonhos proféticos. Seria interpretando esses sonhos que, apesar de toda a dificuldade e hostilidade contra o dom de Deus (mesmo de sua família, algo que ecoaria nas palavras do Senhor ao tratar da relação da Boa Nova com parte dos descendentes de Israel), José salvaria a sua família indo para o Egito (Gn 50,20).
Não por acaso, São José, filho de Jacó, recebe sonhos proféticos que, apesar das circunstâncias difíceis e a violência que seu filho, o Salvador, certamente sofreria, salvam a Sagrada Família.
O primeiro sonho evita que São José, homem justo, abandonasse a Virgem Maria para não causar mal a ela. O anjo o avisa e São José aceita a vida que Deus preparou para ele como marido casto da Virgem Santíssima e pai do Filho de Deus. Em um segundo sonho, São José é avisado sobre o massacre que viria e foge com a família. Para onde? Para o Egito! De novo, isso não é coincidência. É o artista divino pintando o quadro da História da Salvação com tintas familiares, mas eternamente novas.
Então, ao destacar o versículo 16 (Mt 1,16), a Liturgia produz (destaca) um ‘inclusio’ ao demarcar “José, filho de Jacó”. Ela poderia ter começado no versículo 18 e contado a mesma história, mas destaca o verso 16 (pula o 17) exatamente para que se note o ‘eco’ de José como o Novo José do Egito. Dessa vez, a fuga para o Egito não terminaria em escravidão, mas em libertação pelas mãos de Jesus Cristo, um Novo Moisés.
Como prometido, eu destaco um segundo ‘inclusio’, o maior do Novo Testamento. De fato, ele tem relação direta com o sonho de São José. O maior ‘inclusio’ do NT é feito com os versos “Mt 1,23′ e o último verso, “Mt 28,20”. O primeiro destaca o fim do sonho de São José e o cumprimento da profecia de Isaías (Is 7,14): “Ele se chamará Emanuel, que significa Deus conosco”.
No último verso, o que diz o Senhor? “Eu estou com vocês sempre, até o fim dos dias”. Então, o primeiro verso do ‘inclusio’ marca a promessa de “Deus conosco” e o último marca o seu cumprimento. Deus está conosco. Melhor ainda! Ele estará conosco sempre.
Entre a promessa e seu cumprimento e elevação? Tudo começa como num filme, com o acordar de um prólogo em forma de sonho. São José desperta do sonho que, de fato, abre a história, e se põe a caminho para cumprir a vontade de Deus. Começa ali, com São José, o homem justo, um sonhador, o Novo José do Egito cujo “sim” silencioso também propicia que Deus aja na história.
O silêncio de São José fala mais alto que mil palavras. Que o sonhador São José nos ajude a enxergar que Deus está conosco até o fim, não importa quando ou como. É preciso acordar agora para começar a caminhada. Uma cujo primeiro passo é só um “sim” a Deus. Pode ser em silêncio. Basta um “sim” para que o nosso adormecer, mesmo se for cedo como foi o de São José, seja o primeiro passo para uma caminhada na eternidade com o Senhor.
São José, sonhador santo, marido casto e justo, pai amoroso e destacado, rogai por nós!
Em Cristo, entregue à proteção da Virgem Maria,
um Papista
Texto iluminado, revelador. Obrigado
Eu que agradeço pela gentileza. Fique com Deus!
Texto iluminado, revelador. Obrigado
Vc consegue trazer perspectivas geniais. Muito inspirado. Muito obrigado
Muito obrigado pelas palavras gentis. Fique com Deus!